terça-feira, 27 de janeiro de 2009

CORRESPONDÊNCIA No 7

...

O GRITO:

Aaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh... !!!


O PRÓLOGO:

Com certeza é preciso dizer, antes de mais nada, que nenhuma palavra consegue chegar perto de gritar o necessário! Nem como disse um professor ontem, nem as maiúsculas, que parecem naturalmente gritos, nem elas expressam em palavras altas tudo sincero como deveriam.

Os animais que sabem bem o que fazem! Seus grunidos são tão próprios, eficazes, não há duvida que depois de grunir, mugir, latir, e berrar sentariam-se em seus sofás, caso os tivessem, abririam uma cerveja, caso fossem abastardos com o divisor de águas polegar opositor, e esboçariam um belo e branco sorriso, caso usassem pasta de dente colgate.

Mas não o fazem, não possuem e não usam, limitam-se ao que há apenas de essencial, ó sábios animais, gemem, grunem, mugem, latem e berram. [Como somos todos estúpidos a nos perder em palavras].


A CARTA:

Mon chere,

quem te fala é uma morta. Assim como desejastes.

No entanto, menos em paz do que a morta de Nelson e Herculano, e menos morta, aliás, enterrada viva, ou ainda pior, apagada da história como nunca tivesse existido, sem choro nem vela, nem caixão com fita amarela.

Apagada da história ainda viva. [-quem, ela ou a história? Ambas vivas e igualmente riscadas de todo e qualquer mapa].

Que paradoxo de dor.

Que fizestes da única coisa que me restara? Que fizestes do único canto certo no qual garantia toda minha [in]certeza?

Que fui esquecida, superada, que tornei-me quase nada, poeira no vento, nada disso nos é novidade. Que o passado passa, o presente é vida e o futuro a deus pertence, de tudo isso sabíamos bem desde o início, quando há poucos anos nossos cheiros se abraçaram.

Mas, meu querido amigo, que nem na arte restaria o resto de mim em você!? Que nem da arte ficaria eu, para alem de criadora, uma bela, talvez, criatura!?

Ah que peça me pregastes, eis que surge tu, como sempre, a criar de todo modo e alcance, tanta beleza... que vem agora numa peça, e como não deixaria de ser, é tão linda e suave melodia... claro, para o aplaudo como sempre, (chego até a sorrir por um segundo) e não esqueço!

Tudo passa e morreremos. Talvez seja este um dia-marco, dia-d, onde deixamos de lado a inocência vil do artista-quando-jovem que, não só se quer tão gênio, mesmo sabendo que até Pessoa se iludira, mas que se quer imortal e que só para isso vive.

Imortal o que! Se foi mesmo um físico muito amigo de papai que ainda ontem, sentados à mesa de bar, nos disse no bom e velho português, com todas as palavras, nessa linguagem que nos resta à comunicação, ou melhor se diga, ao fingimento dela, as palavras, nós que não somos os animas (e que pena), pois nos disse então o físico: “sim, se existe uma certeza além da morte é a de que tudo vai mesmo se acabar, não há história, não há memória, tudo vai desaparecer, então tratemos de aproveitar a vida e sermos felizes”.

Tudo bem que já sabemos que as coisas não funcionam lá tão assim, mas supondo mesmo que não há memória e não há história, e que vai tudo mesmo pros cafundós dos judas (ou ainda mais longe do que isso, seja lá onde for), não há mesmo com o que se preocupar.

O artista então, de fato, não cria para eternidade, posto que esta em si já é um parodoxo. Vá então criar pra outro! pensei.

E talvez assim eu pense.

Mas não agora.

Talvez porque não seja como artista que o suplico, talvez seja essa a dor de musa, ah, sendo mais realista, falsa-musa que nada mais é do que morta viva apagada e liquidada da história, sem que o corpo tivesse esfriado, ou ainda mais grotesco, sem que haja o tal presunto, mas um corpo vivo, quente, muito quente, que arde com febre da dor de quem foi apagado vivo, retiradofeto.

Morri.

Pronto, conseguimos: morta.

Descobri o ponto, aquele mais fundo do que o poço fundo do elevador de onde tanto temi afundar.

Assassinada em obras e vida, não, antes ainda, jornada inexistente de um artista nati-morto.

Sei que nada fizeste por mal, não sei o que pensas, o que será pensou? Não importa, como disse Baudelaire, ou qualquer outro gênio que não foi apagado da história em questão, “mate ou morra”. [ou corra?]

Provável que não soubesses a dor que causaria... provável que soubesses, afinal, sabemos, meu bem, queira ou não queira, conhecemo-nos e me conheces bem. Meu bem.

Achei que estava protegida no esquecimento da gaveta da obra imortal. Achei que o fim na vida era o voar da arte e das canções.

Não entendi o físico e não supus que a imagem, a tal fotografia ainda jovem, pudesse desvanecer.

Não pensei que meu nome, gravado na pedra cantada em letras tão belas que de passado seriam sempre, sempre, futuro; não achei que até mesmo essas belas palavras que me foram tão caras com um título igualzinho ao escolhido por mamãe, no exato dia em que nasci, fossem passíveis da crueldade do rabisco e da borracha, pior, da rasura. Não pensei que, como já anunciara o velho físico: não há memória, nem história. Nem para nossas palavras.

Vivamos.

[mesmo que em prantos]

Minha obra não te cala e não te rabisca, e em minha gaveta ainda jaz sua música com meu nome, protesto e grito, como não fazem os animais:


eu não esquecerei.




ah! e quase ia me esquecendo, lemos hoje no atêlie Paulo Mendes Campos e Antonio Maria, nem preciso dizer que lembrei de você... quis ir, claro, assim que chegue em casa, em busca dos dois livros, de tantos, que você me deu... mas não pude... e cito nosso querido amante da vida, Antonio:

"O homem só tem duas missões importantes: amar e escrever à máquina. Escrever com dois dedos e amar com a vida inteira."


é, acho que não vou tão mal assim...caro maria

...

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

CORRESPONDÊNCIA No 6

Mon chere,

Sinto uma saudade agressiva no peito.

A agressividade do silêncio.

Ando descobrindo que nada posso fazer de pior do que meu próprio silêncio, mas também, se nada posso fazer de melhor...

A distância não está nos kilometros ou metros, mas sim no vazio entre o ar de minha boca e a sua.

Depois de suplícios de silêncio, esta nova correspondência quase que salta de meus dedos que, enfeitiçados pelo peito apertado, lhe balbuciam coisa qualquer.

Percebi que, como nos é a vida, as correspondências não haveriam de respeitar tantas regras fixas, todas elas existem e é disso que ganha sentido o que faço. Mas como qualquer gramática já nos ensinou: com as regras vêm todas (inúmeras) exceções. (Assim como é repleto esse idioma que nos é tão caro, a cada um de nós de uma forma tão peculiar, o francês).

Só quero dizer, por favor não me esqueças? E sabendo desde já da impossibilidade de dizê-lo a alguém, o digo mesmo assim, será que podes guardar alguma coisinha bonitinha qualquer de mim? E de nós?

E te tranqüilizo: eu o faço e farei, e não será alguma coisa qualquer, e nem será diminutivo.

Ah, mas preciso dizer antes ainda, por favor veja o tamanho da sinceridade e do amor que vêm sempre contidos em minhas palavras, como nas últimas...? veja que nada há de burocrático, aliás, nada nunca houve de formal ou dentro de padrão algum que não fossem os padrões avoados e vagos, esvoaçados do amor.

Fico por aqui pois descobri que também nada pode haver de melhor em mim agora do que algum silêncio.


O carinho...


eu

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

CORRESPONDÊNCIA No 1

Mon cherre,

Desde daquele nosso último almoço (com direito a rápido adendo) tive a certeza de que poderíamos dar asas a borbulha de nosso encontro que, não podendo ser concreto, físico e coberto de paladar, seria, definitivo, ou melhor, eterno, uma vez que entraria para a história, através de nossas correspondências que permitiriam nelas todo o amor que não soubemos expressar criativamente e o faríamos agora, nas palavras sons e imagens que produziríamos de um e outro para um e outro.

É importante que fique claro que respostas não são exigidas, escrevo essas palavras, nesta correspondência que chamarei de numero 1, porque depois de nosso último encontro vi o quanto teria para falar e que em não podendo, por tanta fraqueza e incompetência de nossos humores, fazê-lo garganta a ouvido direto, o faria, com todo interesse de que sou capaz, dessa maneira virtual como se costuma dizer nos dias de hoje.

Poderei fazê-lo em palavras como também em imagens e som e a única regra na qual manter-me-ei fiel é que essa é a apenas a correspondência numero 1 de uma série que não será pequena.

No segundo momento me veio a birra com relação aos aparatos nos quais poderia me apoiar para tais correspondências. As palavras virtual e digital já não me agradam há um tempo, uma vez que sinto necessidade de ultrapassar esses limites e barreiras obscurecidos pelos nomes de liberdade e democracia. Não que não o sejam de fato, mas ha algo de redutor e fugaz, demais, nesses meios de onde quero desviar meus devaneios.

Tampouco queria eu voltar ao meu velho e fetichizado hábito da pena, ou, mais simples, caneta. Passei parte da vida me utilizando desse recurso enquanto me sentia uma senhorita da idade media escrevendo a pena para seus amores escondidos. Não deixei de amar a pena e o naquim, mas sentia que o amadurecimento dos anos precisava me trazer a algum lugar no meio termo de tudo. Um entre espaços e tempos, onde eu estava querendo alcançar (ou de onde queria saltar).
Foi então em pleno set de filmagem, escutando um mestre falar de seus velhos hábitos ao se corresponder com os entes queridos em sua velha e conhecida máquina de escrever que encontrei a saída. Seria isso, a velha máquina de escrever de meu pai que a herdou de meu avô e que estava repousada em algum antigo armário da casa de meu pai, não tão velha, mas já meu antigo lar, onde vivi até os poucos meses atrás quando construí asas e vim para em minha própria casa.

Ironia ou não, é aqui, na conhecida casa de meu pai, de onde escrevo-lhe essas palavras.

Percebi logo de cara que não é nada fácil, essa tecnologia que nos parece tão rústica é mais sofisticada que meu novo e branco laptop, e requer sapiência, calma e muita sonoridade na cabeça e nos dedos para conseguir executar o feito com a precisão necessária para alcançar a beleza da musica em nossas correspondências.

Pensando em lhe falar me arrebataram, novamente, muitas duvidas, voltei a questionar qual era o sentido de tais correspondências, voltei a pensar se existiria mesmo uma atmosfera, um ar propicio para nossa comunicação, mesmo que “virtual”. Considerando alguns telefonemas não retornados me questionei por muitas vezes se haveria algum eco em minha aproximação tão coberta de amor quanto de respeito profundo pelo objeto e receptor dessas fantasias e, como você pode ler, cheguei a feliz conclusão de que sim, iria escrever!

O caso é que não teria como não fazê-lo, como você me conhece bem, sou teimosa e não sou capaz de olhar com rabo de olho simplicidades tão corriqueiras quanto fantásticas de nossa vida cotidiana e meu encontro com você, meu querido, todo esse ar quente, fervendo de faíscas tão inspiradoras (quanto já foram piradoras) não poderia e nem iria sumir no ar e só me restava transformá-lo nessa serie que inicio com o titulo de correspondência numero 1.

Boa jornada. Termino aqui no começo onde já não somos mais o que fomos e estando prestes a nos tornar tantas coisas as quais desejemo-nos!
Esteja livre para embarcar da maneira como queiras e estarei aqui livre para viajar de todo modo não sonhado.

Termino esse inicio citando você, sem duvida alguma uma das maiores inspirações que cruzaram meus sentidos, obrigado por voar conosco!

Até breve, mon petit cherri.

aurevoir